sábado, 15 de outubro de 2016

O Cântaro nosso de cada dia

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O contexto social em que Jesus aparece na vida de uma mulher era este: Judeus e samaritanos não se comunicavam, não se confraternizavam, não usavam os mesmos utensílios para comer ou até mesmo para beber água por causa da lei da purificação que o povo de Samaria não observava. Mas Jesus rompe as barreiras imposta pela sociedade pedindo um pouco de água para aliviar o calor do dia. A atitude dele a surpreende: Como sendo tu judeu falas comigo que sou mulher samaritana?

Eu fico pensando: Quem em sã consciência negaria água para outra pessoa? Ela, que nunca tinha ouvido falar sobre o Mestre, seus milagres, sua compaixão, não tinha qualquer expectativa de melhorar a convivência entre os dois povos a partir de um diálogo. Mas a cada indagação da mulher uma revelação surgia. E de um completo estranho Jesus passou a ser a fonte da água viva, um profeta e o Messias. A verdadeira adoração a Deus passaria de uma visão local para um padrão universal.

Mas queremos nos deter a vida diária da samaritana. Ela que já estava no sexto relacionamento, não era bem vista pela sociedade e provavelmente, era só mais uma das muitas que viviam na cidade. As idas e vindas ao poço era um trabalho cansativo, mas não havia outro lugar no qual pudesse obter aquele líquido tão precioso. O horário também não era um dos melhores, mas o que se podia fazer? Com seu cântaro nas mãos a samaritana caminhava todos os dias para pegar água no poço, levando também nos ombros uma carga pesada, uma ferida aberta, humilhação e vergonha...

Os diversos envolvimentos amorosos devem ter deixado marcas em sua vida e como estava o seu coração diante de Deus com todas aquelas culpas lhe assombrando? Talvez, o trajeto até o poço fosse o único momento de solidão e reflexão que apreciasse. Quem sabe, mesmo sentindo a areia quente sob os pés, olhando as montanhas ao longe, o céu tão azul, a samaritana pensasse que Deus a amasse apesar das suas imperfeições?

E foi naquele dia que aconteceu algo diferente. Enquanto a mulher caminhava devagar até o poço, vê a figura de um homem sentado numa pedra. Ela não tem a intenção de olhar para ele. E enquanto procura um jeito de tirar a água armazenada, reconhece a roupa, a fisionomia de Jesus como um típico morador da Judeia. A mulher sabe o seu lugar e permanece calada até que não pôde mais ficar indiferente àquele homem que pedia água.

O cântaro nosso de cada dia parece perfeito. Ele é indispensável, é companheiro. Um recipiente para qualquer tipo de “líquido”, em que as nossas emoções se transformem. É nele que guardamos nossas mágoas e ressentimentos. E como ele é pesado! Porque com as idas e vindas à estrada da vida também colecionamos histórias, fantasias, sonhos, tristezas, decepções, desilusões.  O cântaro se transformou naquele vínculo com o passado que por alguma razão, não queremos esquecer.

E não é o que acontece conosco? Estamos tão submersos nos problemas que olhamos para Jesus, reconhecemos o seu poder, mas ficamos perplexos por ele está ali, pronto para nos abençoar. E nos silenciamos. Mesmo sabendo que Ele é fiel e justo. E assim ocultamos nossas dores, nossas indagações, por medo, insegurança, desconforto. Ou às vezes, porque é mais cômodo continuar a tirar água do poço como estamos acostumados, do que se aventurar em buscar água em uma Fonte.

Porque nem sempre é fácil reconhecer que erramos e que negligenciamos algo importante ou que estamos sofrendo a consequência de nossos próprios atos. É sempre mais fácil colocar a culpa em alguém do que aceitar que precisamos mudar de atitude.

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Mas a fonte também estava ali bem diante da mulher samaritana. Ela podia sentir o calor do sol, mas também um refrigério na alma. Talvez a mulher estivesse abraçada ao cântaro, seu único amigo até aquele momento.

E Jesus questiona a mulher, confronta e restabelece limites. Ele amplia a visão espiritual da samaritana. A conversa continua até que de repente, a mulher sai correndo em direção à cidade. Jesus olha para o chão e lá está o tal cântaro, abandonado, como se não tivesse mais nenhum valor.

Marion Vaz


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