“Papa Bento XVI fez uma desoneração ampla do povo judeu pela morte de Jesus Cristo em um novo livro, abordando um dos temas mais controversos do cristianismo.” 1
A notícia que repercutiu no Jornal Haaretz e em todos os noticiários do mundo isenta o povo judeu (como um todo) pela morte de Jesus.
Em seu livro Jesus de Nazaré o Papa Bento XVI ofereceu uma meditação muito pessoal sobre os primeiros anos da vida de Cristo e seus ensinamentos. Esta segunda parcela, que será lançado 10 de março, diz respeito à segunda metade da vida de Cristo, sua morte e ressurreição.
Benjamin Netanyahu, Primeiro Ministro de Israel, enviou uma mensagem ao papa na quinta-feira dizendo: "Eu o elogio por rejeitar vigorosamente em seu último livro uma acusação falsa que deu origem ao ódio contra o povo judeu por muitos séculos"
Em 1965, o Concílio Vaticano já havia publicado um documento conhecido como Nostra Aetate, que rejeitava completamente a ideia da culpa judaica pela morte de Jesus e condenava qualquer afirmação de que os judeus era um povo rejeitado por Deus. Tal declaração deve ter tido como base Isaías 41.1 "Assim diz o Senhor que te criou o Jáco e que te formou ó Israel: Não temas porque eu te remi, chamei-te pelo teu nome, tú és meu"
Analisando os quatro Evangelhos que retratam a vida de Jesus em suas diversas fases, reparamos que todas as passagens sobre a crucificação apontam como agressores físicos de Jesus os soldados do Império romano. (ver Mt 27.26-37; Mc 15.15-24; LC 23.33-38; Jo 19.23-24).
O fato de lavar as mãos também não isenta Pilatos de sua parcela de culpa!
Observe que em todas as traduções feitas ao longo dos anos para qualquer idioma, sejam em versões corrigidas ou atualizadas, todas as atrocidades cometidas contra Jesus foram feitas por soldados romanos. Foram eles que, por ordem de Pilatos açoitaram, cuspiram, lincharam, humilharam, crucificaram, usaram pregos em suas mãos e pés, colocaram coroa de espinho, ofereceram vinagre, repartiram suas vestes e tripudiaram sobre o condenado e para se certificarem, que estava realmente morto, furaram seu lado com uma lança! E fizeram isso sem qualquer constrangimento!
A morte por crucificação era comum em todo Império, por isso além de Jesus havia outros dois homens na mesma situação. Quem eram eles? Quais os seus nomes? Eram judeus? Tinha algum familiar por perto? O texto bíblico não exprime qualquer comoção com o sofrimento deles! A minha versão diz que eram malfeitores. Todo relato se concentra apenas em Jesus e toda interpretação bíblica gira em torno de sua obra salvífica!
Assim, mesmo que toda responsabilidade tenha sido repassada para a "aristocracia do Templo em Jerusalém e as massas que preferiram soltar Barrabás” conforme declaração papal, não se constitui culpa alguma ao Sinédrio, pois o Conselho composto de 71 pessoas que representavam a autoridade suprema no campo religioso, político e judiciário do povo judeu, estava convicto de seus direitos e deveres.
Embora membros da Corte Judaica tenham tido a iniciativa de levar Jesus a Pilatos para ser julgado e condenado por blasfêmia, pois na época os judeus embora gozassem de liberdade religiosa não tinham permissão para matar alguém e na hora da crucificação estivessem presentes, não há relato de que qualquer um tenha estado perto o bastante para tocar em Jesus.
É importante ressaltar que segundo as leis judaicas nenhum judeu praticante, ancião, doutor da Lei, sacerdote, levita, fariseu ou saduceu (termos utilizados no NT) tocaria num homem ensangüentado ou semimorto, as vésperas do Pessach! Segundo a Torah era estritamente proibido chegar perto de um morto como se lê em Levítico 21.4 e Números 19.11-15 com a penalidade de ter que ausentar das atividades do Templo até o prazo estipulado para purificação. Era véspera do Shabat! Véspera do Pessach!
Toda perseguição ao povo judeu com base na morte de Jesus (Deicídio) foi um ERRO alimentado pela interpretação errônea de textos bíblicos, pelo fanatismo de líderes religiosos e pelo anti-semitismo. Como os judeus haviam declarado:“o seu sangue (de Jesus) caia sobre nós e sobre nossos filhos”, até mesmo os primeiros apóstolos como Pedro (Atos 3.15) e Paulo (1 Ts 2.15) levaram suas acusações ao extremo. Também poderíamos citar Lutero em sua obsessão de converter judeus e todas as suas declarações maléficas e uma lista sem fim de inimigos da fé judaica que pode ser pesquisada na Google.
E já que estamos a um passo da verdade, se houve esse pecado o próprio Jesus na hora da crucificação intercedeu por todos clamando: “perdoa-lhes porque não sabem o que fazem” (Lucas 23.34). É interessante que tal declaração passe despercebida e que teólogos afirmem que o ladrão crucificado ao lado de Jesus recebeu o perdão dos pecados de imediato (Lc 23.43)!
Mas, deixando o ponto de vista histórico para entrar numa questão dogmática, é indiscutível que o Cristianismo está alicerçado no fato de que "Jesus se ofereceu como sacrifício vivo e agradável a Deus para salvação da humanidade". O versículo ícone da crença está em João 3.16 que diz que “Deus amou o mundo de tal maneira que deu o seu filho unigênito para que...” No capítulo 10 o próprio Jesus afirma que ele era o bom pastor e dava a sua vida pelas suas ovelhas (v 11), e que “...ninguém a tira de mim e eu mesmo a dou...” (v 18).
Esse sacrifício pessoal e intransferível pode se notar claramente no episódio da agonia no Jardim do Getsêmani (Mt 26.39), e que transformou-se na doutrina que rege a fé de milhões de pessoas: “Cristo morreu e ressuscitou para remissão dos pecados de todo aquele que crê”. Já em Apocalipse 13.8 lemos que “o Cordeiro foi morto desde a fundação do mundo” e o pecado de Adão trouxe morte espiritual a todos os homens (Romanos 5.12).
Interpretações ao longo dos textos da Tanach apontam que Deus instituiu Leis e sacrifícios de animais para aplacar sua ira e perdoar os pecados do homem. Já no Novo Testamento tais sacrifícios seria substituídos pelo de Jesus. Também é comum ouvirmos crentes em todo o mundo afirmarem: “Cristo morreu por causa dos meus pecados!”
Uma reportagem num jornal de grande circulação afirmava que Cristo havia morrido de enfarto! Arqueólogos em Israel descobriram um homem do século primeiro que devido ao tipo de enterro (parecidíssimo com o de Jesus) levou a suspeita de que Jesus era leproso! Afinal, o que ou Quem matou Jesus?
Com base em todas essas afirmações pergunto: Se tudo foi meticulosamente planejado por Deus, e se por causa do pecado do homem (que faz separação entre o Criador e a criatura) Jesus se ofereceu como sacrifício pleno, por que os judeus foram alvos de críticas e perseguições? Por que foram acusados sem terem culpa?
A morte e ressurreição de Jesus e a formação de uma nova religião monoteísta não deveria ser nenhum problema para a coexistência pacífica com Israel nos dias de hoje. Assim, acreditamos que a declaração do Papa Bento XVI só vem confirmar aquilo que está exposto na própria Bíblia.
A nossa esperança é que tais argumentos modifiquem a maneira de encararmos os textos bíblicos. Aí sim "Conhecereis a verdade e a verdade vos libertará" do ódio, do preconceito, da intolerância religiosa, da ignorãncia e da falta de amor ao próximo! Aí quem sabe? "os teus pecados são perdoados"!?
O que nos leva ao segundo passo do nosso artigo: o respeito às tradições e a fé judaica. Israel prevaleceu contra seus inimigos ao longo dos anos e os judeus preservaram a essência do Judaísmo e sua fé no Deus Único.
Para aqueles que insistem nessa perseguição religiosa ao povo judeu não seria à hora de rever seus próprios conceitos? Trago a lembrança uma observação exposta no livro de Atos 5.38-39 e que é bem oportuna:
“...porque se esse Conselho ou essa obra é de homens, se desfará. Mas, se é de Deus, não poderei desfazê-lo; para que não aconteça serdes achados combatendo contra Deus.”
Marion Vaz
1 Fonte: http://www.haaretz.com/jewish-world/
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