domingo, 6 de dezembro de 2020

Há tanta vida lá fora


Eu sei que o post anterior deixou muita gente assustada. Afinal, a gente cresce com certos conceitos e são eles que justificam nossas atitudes no dia a dia. Amar ao próximo é um deles. Amar as pessoas independente da maneira como nos tratam também faz sentido. É lógico que devemos amar nossos pais e ajudá-los  em suas dificuldades, estando sempre por perto. Afinal, muitos deles já passaram por uma série de perrengues durante a vida toda. E conhecer toda a trajetória nos ajudar a entender e relevar muita coisa.

O fato é que a medida que o tempo passa algumas pessoas se deixam levar por sentimentos ruins. Antigamente a vida era  muito difícil, acrescente uma infância pobre, pai muito agressivo e responsabilidade com irmãos mais novos e vamos ter um quadro bastante significativo. Quando faltava comida muitas vezes teve que pegar xepa (restos) na feira do bairro para levar pra casa. Foi apelidada de "Tomate machucado". Sim. Muitos bullings. Fazia serviços para os vizinhos para ganhar uns trocados. Trabalho infantil naquela época não era crime. Pegou muitas latas de água para a família e para os outros. Sapato velho e roupas ruins. Não completou os estudos porque meu avô não deixou. Casou cedo (16 anos) porque meu pai a amava muito. Teve 4 filhos. Muitas outras dificuldades financeiras deixaram suas marcas na alma. 

Depois que meu pai faleceu vieram as enfermidades: Câncer, quimioterapia, pressão alta e gastrite nervosa. Estar ali do lado dela enfrentando tudo também não foi tarefa fácil. Outros problemas hoje fazem parte do dia a dia. Então já dá para entender que a vida nem sempre sorri, e foi assim que minha mãe se tornou esta pessoa amarga e sem esperança. Hoje tem 80 anos e vive contando os dias e as horas na ilusão que tudo termine como um sopro.

Fico triste com isso, confesso. Porque "há tanta vida lá fora" como diz a letra da música e a gente precisa entender que "cada minuto é um milagre". Sinto falta daquela pessoa alegre e risonha que ela era antes. Hoje é só reclamação e desilusão que se alternam em desabafo e agressões verbais. E não há conselho que se dê que faça ela repensar e mudar a trajetória da vida dela. 

E, infelizmente, tudo começou lá trás no passado com uma infância difícil que ela teve. A gente precisa entender que o tempo passa e nem sempre cura todas as feridas. E às vezes, leva o melhor das pessoas.

Mas fica aquele nó na garganta de que um dia ela não vai mais estar entre nós e a saudade vai ser imensa. Afinal, ela é minha mãe.

E se eu puder te dar dois conselhos, querido leitor, permita-me dizer que podemos entender as atitudes das pessoas conhecendo os problemas que afligiram a alma, perdoar para seguir em frente e assim sermos solidários sem nos deixar ferir. 

E segundo, zelar por aqueles que amamos para não repetir os mesmos erros.


Marion Vaz