terça-feira, 28 de junho de 2011

Choque cultural

O texto bíblico de João 4 retrata o encontro de Jesus com uma mulher que habitava na região de Samaria. A mulher vinha ao poço com seu cântaro para buscar água e Jesus estava sentado numa pedra, próximo ao poço aguardando seus discípulos que teriam ido a cidade comprar comida.

Ao se aproximar do local a mulher ouviu o homem a pedir-lhe um pouco de água. Era bem provável que estivesse com sede, devido à longa caminhada que fizera até ali. A mulher se surpreende com tal pedido e assim inicia-se uma conversa.

O que me chama atenção no texto é que a samaritana reconheceu Jesus como um homem judeu, talvez pelo porte físico, pelas roupas, pela maneira de se comportar, enfim, poderíamos fazer dezenas de conjectura sobre o assunto. Ela não o reconheceu como o profeta de Nazaré, homem da Galiléia ou qualquer outro título que Jesus carregava, mas como um morador da Judéia.

Interessante ressaltar que Jesus passou grande parte de sua vida na Galiléia, numa cidade chamada Nazaré, mas naquele momento suas feições eram de um verdadeiro homem judeu.

A indagação da mulher ao se assustar com o fato de que um homem, um judeu pedisse para beber água em sua vasilha, faz com que o escritor se detenha numa pequena observação que a nossa tradução fez a gentileza de optar pela seguinte frase: “por que os judeus não se comunicavam com os samaritanos” (Vs 9).

Só essa frase já o suficiente para se faça várias observações vexatórias a respeito dos judeus chamando-os de preconceituosos. Mas observe que observações da convivência desses dois povos é bem explorada no próprio texto dos Evangelhos, como também em textos do Antigo Testamento.

As diferenças religiosas, principalmente em relação às leis da purificação, são as responsáveis por toda aversão entre eles. No desenrolar da conversa a própria mulher samaritana cita algumas dessas diferenças, a começar pelo fato de que judeus e samaritanos não compartilhavam dos mesmos objetos, especialmente se fossem utilizados para comer ou beber.

A adoração a D-us também tinha o seu lugar definido, para os judeus era em Jerusalém (1 Rs 9.3) para os samaritanos era no monte Gerazim (Jo 4.20).

Essas divergências começaram com Jeroboão que dividiu Israel e as dez tribos passaram a segui-lo e ele criou um centro de adoração para que ninguém descesse a Jerusalém. Quando Assíria levou para o cativeiro as 10 Tribos de Israel a terra ficou deserta. Então trouxeram uma mistura de gentes para habitar ali. Outros acontecimentos importantes foram se caracterizando em diferenças culturais e religiosas até chegar à época de Jesus para que através daquela simples conversa colocasse por terra todas as diferenças que havia.

Mas eu pergunto? Era preconceito dos judeus? Não! Pode ser que alguém tivesse esse sentimento, mas aqui, no texto é o que podemos denominar de choque cultural. Eu não entendo essa praticidade com que alguns preletores têm de utilizar o texto bíblico em função de depreciar os judeus da era bíblica.

Numa reuniões alguém fez da introdução da sua pregação uma analogia sobre como as mulheres já eram tratadas com certo preconceito e usou como exemplo, a seguinte frase: “os judeus diziam que se um homem conversar com uma mulher por cinco minutos ficaria burro”. Interessante, porque ele poderia ter mencionado que o apóstolo Paulo declarou que “as mulheres deveriam ficar caladas na igreja” (1 Cor 14.34). Paulo era preconceituoso? Era machista? Não!

Interessante que, por um período na História da humanidade, a mulher não tinha direitos na sociedade, era vista como objeto sexual, de reprodução, e na maioria dos povos circunvizinhos de Israel, povos idólatras, a mulher não podia sequer se expressar. Mas se olharmos os textos bíblicos, o próprio Deus se preocupou com isso e a mulher hebréia, embora o homem detivesse toda a autoridade, ela era respeitada, tinha direitos e era protegida pela Lei. Mas esse costume, essa cultura fazia parte de todas as sociedade do mundo antigo.

O ditado popular apresentado não caracteriza um preconceito, ou mesmo que assim fosse (caso o leitor insista) não se constitui nos dias de hoje um conceito defendido pelo povo judeu. Muito pelo contrário, pois a mulher alcançou seu papel de destaque na sociedade, na igreja, na política e em diversas áreas que até então eram apenas consagradas ao sexo masculino. E não seria o judeu a negar os direitos da mulher e desqualificá-la.

O preconceito, a meu ver está no crente, que menospreza o contexto sócio-cultural dos tempos bíblicos e usa qualquer tipo de analogia para inverter os papeis e favorecer o Cristianismo em detrimento da religião e cultura judaica. E infelizmente eu me torno repetitiva para defender os Bney Yaakov, a respeito desse tipo de “interpretação” que promove a ignorância e a falta de entendimento do texto sagrado.


Marion Vaz

Link sobre provérbios judaicos: http://www.fraseseproverbios.com/proverbios-judaicos.php

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